segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
O Menino
Entrei no ônibus e fui logo tirando o caderninho de desenho da bolsa. A viagem de duas horas deveria ser preenchida com rabiscos, músicas e paisagens borradas. À minha frente, sentado do outro lado do corredor e distante duas fileiras da minha, estava o menino.
Seu olhar acompanhava atentamente o movimento de quem entrava pela porta do ônibus. Em seu colo, ele guardava uma trouxa de roupas envoltas por um forro de mesa florido. Tristeza e curiosidade pareciam co-habitar aqueles olhos.
Aquela imagem pedia para ser registrada. Comecei, então, a rabiscar um desenho com linhas bem finas. Na intermitência do meu olhar que dançava entre o menino e o desenho, percebi que a mulher a seu lado, que julguei ser sua avó, cochichou no ouvido dele e apontou para mim.
A distração que o entretinha pulou pela janela e sua atenção repousou sobre o meus traços. Levantei o caderno na altura dos olhos dele e perguntei: Gosta? Silenciosamente ele olhou a vó como se pedisse permissão para responder e em seguida balançou a cabeça afirmativamente. Rasguei a folha do caderninho e dei o desenho para ele.
Entre cochichos com a vó e uma foto que eu furtivamente consegui fazer com o celular, a viagem continuou sem que ele tirasse os olhos do desenho.
No exato momento que o ônibus parou em uma das tantas cidadezinhas do meio do caminho, percebi que ele guardou o a folha já amassada e me olhou rapidamente enquanto numa mão segurava a trouxa de roupas e, na outra, a vó que não conseguia se mover sem ajuda.
Pela janela, antes do ônibus continuar a viagem, ainda puder ver os dois sumindo vagarosamente calçada afora. No caminhar, rastros de infância deixados para trás não conseguiam acompanhá-lo.
Foto: Wolney Fernandes
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Um comentário:
Perfeito seu texto, consegui sentir e até ver o olhar dessa criança
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