Ontem foi o lançamento do livro "Cartas na Mesa" do meu amigo Rafael Vieira. Pela primeira vez, além da ilustração da capa, eu também assino o prefácio da obra. Nas palavras do autor, a idéia do livro surgiu à partir da leitura freqüente do meu blog e, mais especificamente, das minhas cartas à Sofia.
Por esta razão, o texto que elaborei para abrir/apresentar o livro foi também escrito em forma de carta que, diga-se de passagem, é meu estilo preferido de leitura/escrita. E só para responder à motivação feita pelo Rafael no "P.S." do livro:
- Sim, participar desse projeto tão bonito me impele a desengavetar meus textos e imagens. Quero que eles desabrochem de novo, de um outro jeito.... para lembrar o que vivi. Que sejam impressos em páginas de papel pólen para acumular estímulos e desdobrar novos sentidos. Obrigado pela belíssima motivação!
Senhoras e Senhores!
A seguir, o meu primeiro prefácio:
"Querida Sofia,
Não gosto da minha letra escrita de caneta preta no papel, da minha voz gravada, da minha imagem em fotografias. Mas sou fascinado pelo instante. Adoro a possibilidade de um agora sem dor e sem ruídos. Embora as últimas semanas tenham sido corridas, com muita coisa acontecendo, ainda teimo em arranjar tempo de olhar para o céu. E o céu acaba nos contando tantas coisas. Hoje mesmo saí antes das seis da tarde de casa. Céu azul, nuvens descuidadas. Em dias assim, vêm à cabeça pensamentos esquecidos. Vontade de retomar planos, juntar palavras de dentro e de fora, buscar simplicidades. Não temer as frases feitas nem os sentimentos desencontrados. Razão pela qual sempre me valho de tuas cartas para que as palavras também me motivem a sair do canto, largar a inércia e tentar mais.
Como quem não se sente mais sozinho em um mar de interrogações, quando te escrevo fico em paz, sereno e confortável por partilhar o que transborda em meu peito. É loucura, eu sei, mas os registros de minhas elaborações, por mais simples que pareçam, fazem-me sentir parte de uma grande conspiração que inclui até os seres mais inconstantes e duais como eu. Diante da escrita projetada no papel, minhas incertezas deixam de ser cabíveis e todas as respostas parecem desnecessárias, ao menos nesse instante.
O livro que acompanha estas palavras é meu modo de te agradecer. Nele você encontrará cartas escritas pelo Rafael. Lembra dele? Pois é, ele também sabe da minha predileção por esse tipo de escrita e por isso me presenteou com o livro que eu agora partilho contigo. Abrindo as gavetas de realidades guardadas nestas cartas, me deparei com esta vontade de mostrar as revelações, as conversas sinceras e os embates como resultado de uma experiência imersa em reflexões.
O endereçamento a trinta destinatários diferentes, torna a leitura ora leve, ora densa... Quando terminei fiquei me perguntando: Não é exatamente esse o movimento que conduz a vida? Afinal, contrastes e variações vão preenchendo nossa existência com um colorido especial, que nem desenho feito com a espontaneidade e a fluidez das tintas. Tristezas e alegrias se alternam, prenunciando o novo que enche de surpresas o nosso cotidiano.
É possível dizer que nestas páginas estão contidas as chaves para se entender o desenvolvimento da vida? Talvez não. No entanto, Sofia, colecionar as pequenas epifanias espalhadas pelas cartas demonstrou o grau de satisfação com o qual sigo nesse emaranhado de relações que compõem minha(s) realidade(s).
Por enquanto não posso dizer mais nada. Anseio, agora, por suas próprias impressões que, espero encontrar em sua próxima carta. Por aqui sigo tentando capturar meus instantes mais pueris naquela esperança menina de aproveitar do tempo só a simplicidade das coisas, de viver nele aquilo que for realmente significativo. De olhar o presente e lembrar de agradecer tudo.
Já se permitiu desejo assim, Sofia? Devias experimentar! Conselho de quem sempre engole um brilhante pedaço daquele sol da tardinha. É tão bom que sinto irradiando um pequeno chuveiro de chispas para dentro de cada partícula do meu corpo tentando colar todos os fragmentos e reunir minha história num único enredo: feliz, raro, meu de fato.
Devo nomear? Ou apenas sentir?
Beijos riscados de saudade.
Wolney.
Imagem: Capa do Livro elaborada por Rony Ribeiro com ilustração de Wolney Fernandes
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