A história do boneco de madeira que queria virar menino era minha preferida e a promessa de tê-lo na parede perto da minha cama foi feita muito anteriormente àquela data. Talvez por isso, a sensação experimentada naquela tarde de domingo foi tão incrível a ponto de retornar amiúde em nacos de lembranças minhas.
O mais velho de dez irmãos, meu pai encabeçava uma lista de talentos distribuídos por uma família numerosa. Sua caligrafia retilínia era sinal de sua destreza com a caneta e de sua intimidade com as artes do fazer. Desenhava sim, mas o desenho nunca foi sua paixão. O desenho aparecia só para acudir os projetos que ele, vez por outra, inventava: balança para pesar ouro, mesinhas de centro feitas em granito, apetrechos de tocar viola etc.
Este é o 18º dia dos pais sem meu pai. Nesse tempo venho tentado delinear quais as imagens da nossa relação que ainda cultivo e o Pinóquio desenhado na cartolina rosa sempre encabeça a pequena lista. Acho que ele nunca soube porque eu também nunca disse, mas nos traços daquele desenho, de certa forma, fui sulcado por duas vontades que ainda carrego: a de desenhar e a de dizer a ele o que eu mesmo desejava ouvir.
Imagem: Wolney Fernandes
Nenhum comentário:
Postar um comentário