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quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

O Sentido de um Fim


"Sempre achei que o paraíso seria uma espécie de biblioteca" 
[Jorge Luís Borges]

Ano passado eu li bem pouco. Neste ano, desejo mudar essa estatística para que os livros que sempre me acompanharam saiam dos acúmulos da estante para repousarem em arrepios que me tirem do lugar. Comecei com um livro do Julian Barnes.

O Sentido de um Fim conta a história de Tony Webster, um homem cujas lembranças se desfiam entre lacunas e reflexões acerca de como a memória pode ser irônica, imperfeita e permeada por subjetividades na [re]construção de um passado, mesmo que seja o seu próprio.

"Quantas vezes nós contamos a história da nossa vida? Quantas vezes nós a ajustamos, embelezamos, editamos espertamente? E quanto mais longa a vida, menos são os que ainda estão por perto para nos contradizer, para nos lembrar que nossa vida não é a nossa vida, mas a história que nós contamos a respeito da nossa vida. Contamos para outros, mas - principalmente - para nós mesmos."

Tony tem sessenta anos e relembra fatos marcantes da amizade com Adrian, um garoto inteligente na época do colégio e de uma namorada que volta a atravessar seu caminho depois de 40 anos. Só descobrimos o porquê dessas lembranças lá no meio da história quando Tony recebe uma carta que o conduz a uma reflexão vertiginosa acerca dos fatos narrados na primeira metade do livro.

Creio que não saber o porquê da seleção daquelas lembranças, me deixou, à priori, um pouco decepcionado com o começo da narrativa quando eu me perguntava porque ele não se aprofundava em nenhuma das memórias e pulava partes que eu, gostaria de saber. No entanto, quando a sombra daquela amizade volta a encobri-lo, o livro ganha uma profundidade que eu achava impossível caber nas 160 páginas que compõem esta edição da Editora Rocco.

As dúvidas e os arrependimentos são postos à prova a cada nova revelação. E cada uma delas nos conduz a reflexões sobre nossas próprias decisões e consequentes arrependimentos. Não foram poucas as pausas que eu precisei fazer diante de determinados trechos onde transferi os questionamentos do protagonista para mim mesmo:

"Quanto menos tempo de vida lhe resta, menos você quer desperdiça-lo. [...] Como empregar as horas economizadas?"

Com um humor afiado, o autor britânico Julian Barnes vai recheando a narrativa dessas memórias com ironias do tipo: "O casamento é uma refeição comprida e sem graça onde servem o pudim primeiro". O enfoque na história do protagonista, faz com que as outras personagens não passem de meras lembranças. Eu gostei bastante do livro, embora ao terminá-lo a vontade de me aprofundar mais em cada um daqueles personagens complexos e pouco explorados tenha ficado para além do fim.

Foto: Wolney Fernandes

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