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quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Imagens de São Sebastião

A versão da história de São Sebastião que conheço conta que ele, um soldado romano, converte-se ao cristianismo e, ao ser descoberto, é morto por flechadas. (ponto)

Outro dia, pesquisando sobre a iconografia que cerca a imagem do santo descobri que ali, no lugar daquele ponto seria melhor colocar uma vírgula. A história continua, pois para minha surpresa, São Sebastião não morreu imediatamente e por isso foi lançado em um rio. Quem o encontrou foi uma mulher que cuidou de seus ferimentos até que ele, recuperado, desafiasse novamente o imperador romano e fosse açoitado e morto de verdade.

Devo dizer também que tais histórias não são tidas como dignas de crença. A pintura em mosaico mais antiga de São Sebastião parece datar de 682 e o retrata como um homem maduro, com barba e em roupas da corte, sem traços de setas. Foi a Renascença que primeiro o retratou como um jovem perfurado por flechas.

A essência desse imaginário e das várias versões encontradas é essa descrita acima. A obra de Ana Maria Pacheco mostra essa mulher (curiosamente também chamada de santa quando é mencionada em sites católicos) envolvendo São Sebastião com os braços numa atitude quase uterina. Dela, me vieram tantas perguntas: Quem foi essa mulher que o encontrou no rio? O que a motivou a cuidar de um desconhecido? Por que ela nunca aparece nas versões oficiais da história do santo?

Todas estas indagações reforçaram meu interesse pela imagem emblemática do mártir. Afinal, não conheço na Igreja Católica outra com um teor tão subversivo e até certo ponto, erótico. Li que a imagem do santo, como a conhecemos, foi criada por Fra Bartolomeo (1473-1517), pintor italiano “especializado” em temas religiosos. Sua pintura em afresco sobre o mártir foi retirada das paredes da igreja pelos monges, sob a “acusação” de que era fonte de pensamentos pecaminosos durante as confissões das mulheres e induziam fiéis a devaneios eróticos.

Uma das configurações mais impressionantes para o imaginário contemporâneo em referência a São Sebastião foi a que o escritor japonês Yukio Mishima interpretou para as lentes de dois fotógrafos japoneses. Ele descreve seu fascínio pelo santo no seu romance autobiográfico ‘Confissões de uma Máscara’, explicando que tudo se originou com sua descoberta como um ‘garoto desejável’ ao ver uma reprodução da pintura de São Sebastião por Guido Reni. Mishima escreveu: “Diante da imagem do mártir, eu logo percebi que meu próprio espírito, o funcionamento de minha mente, tinham se tornado totalmente redundantes. Foi uma experiência estimulante, um estado de aventuras amorosas com o qual eu tinha sonhado há muito tempo”.

Mishima foi um homem que nunca permitiu sua própria decadência física e tirou a própria vida aos 38 anos no auge de sua beleza. A fascinação e registro permanente de sua beleza o deixou imortal como o próprio Sebastião.

13 de Fevereiro de 2008

Créditos das imagens na sequência em que aparecem: 1. Guido Reni; 2. Imagem capturada em http://www.ivygateblog.com/blog/2007/03/ivygate_galleries_young_christian_soldiers.html 3. Eliseo Visconti; 4. Ana Maria Pacheco; 5. Guido Reni; 6. Eikoh Hosoe

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