Do escuro eu só sentia o calor que a textura da parede imprimia em meus dedos. A luz difusa que espreitava embaixo da porta conduzia meu olhar e meus passos. Por um instante a frieza daquele corredor infinito se dissipou em pensamentos de esperança que reacendeu meus sentidos. O cheiro conhecido do alecrim já tomava meu corpo quando minha mão tocou a maçaneta fria. Não houve barulho quando a porta se abriu e eu pude ver meu quarto iluminado em listras amareladas projetadas pela persiana da janela. Um retrato riscado com 6B, repousava ao lado do meu próprio corpo que dormia serenamente de lado. Pude ver o vinco que a posição imprimia em meu rosto e contive a vontade de arrumar o cabelo emaranhado às dobras do travesseiro. Hesitei. Foi nesta breve hesitação que aquele lampejo de consciência me alertou: é só um sonho! Caminhei até a persiana e escureci ainda mais o lugar. Qualquer sinal de luz poderia me expulsar daquele encontro comigo mesmo. Tive vontade de velar por meu próprio sono, pois, ali em meio as lençol azul-escuro que minha mãe tanto odiava eu parecia mais um menino do que um homem de trinta e poucos anos. "Você está sonhando!" - outro lampejo de consciência me fez querer sair do quarto. Fui até o som e apertei o play sabendo que o Prelúdio da Suite nº 1 de Bach começaria a invadir meu sonho com a realidade que aquele gesto imprimia na rotina de minhas noites mal dormidas. Ouvi um barulho e, num sobressalto, meu olhar se voltou para a porta. Foi então que acordei ouvindo o finalzinho do CD com as sinfonias de Bach que eu tinha colocado pra tocar antes de dormir. Passam-se horas até descobrir onde esconder o medo que invadiu meu peito depois daquele sonho. Quando levanto, o mundo roda. Já disseram que a vertigem da queda é o melhor sentimento que existe?
Foto: Wolney Fernandes
Um comentário:
http://www.youtube.com/watch?v=RZgH8sKsTqI&feature=related
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