
Feito náufrago em ilhas habitadas por segredos, olhei fundo a taça que trazia na mão direita e o restinho de líquido púrpura refletiu um pedaço de mim que andava soterrado. Num impulso maroto, destes que nos tomam pela vontade de salvação, atirei garrafa e taça pela janela afora .
Inspirei.
Esperei que barulho de meus estilhaços cortassem o silêncio da noite.
Expirei.
O céu visto do décimo andar se fez espaço em branco sem ponto de fuga. Não havia moldura, nem chão... somente um mar estrelado invadindo o desejo de novos desenhos que habitassem meu corpo. Corpo que na incidência entre imagem e realidade, se abriu para acolher as diagonais que atravessam minhas humanidades. Corpo que, na fraqueza, desejou libertar-se da falsa poesia do moço de "hábitos sempre puros" para se mostrar colecionador de inúmeras fragilidades em ebulição. E daí?!
Não tem margens essa liberdade que, simultaneamente, me faz menino de territórios híbridos e homem que dorme desejando mais vinhos e janelas sem molduras.
Imagem: Wolney Fernandes